O reconhecimento da Indicação Geográfica (IG), do açaí do Arquipélago do Bailique, no estado do Amapá, representa um avanço significativo na valorização da sociobiodiversidade amazônica e na estruturação de sistemas produtivos sustentáveis com identidade territorial. Trata-se de um exemplo concreto de como instrumentos de certificação e propriedade intelectual podem atuar como vetores de transformação econômica e preservação cultural para comunidades extrativistas da floresta.
A IG, na modalidade Indicação de Procedência, foi concedida em abril 2025 pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), e confere ao açaí do Bailique o direito exclusivo de uso do nome geográfico, associado às práticas tradicionais e às condições ecológicas específicas do arquipélago.
O açaí do Bailique é produzido em um sistema extrativista tradicional, caracterizado pelo manejo manual e sustentável dos açaizais nativos, sem o uso de agroquímicos ou mecanização. A certificação por IG reconhece e protege esses saberes locais, ao mesmo tempo em que reforça a importância do território enquanto elemento indissociável da qualidade e autenticidade do produto.
Essa valorização da origem não se restringe ao aspecto produtivo, mas também fortalece a identidade cultural das comunidades ribeirinhas, promovendo o orgulho local e o reconhecimento de práticas historicamente não utilizadas pelas cadeias de produção convencionais.
A IG é uma ferramenta estratégica de mercado ao sinalizar ao consumidor que o produto possui atributos específicos vinculados à sua origem geográfica, agregando valor comercial e fortalecendo a competitividade em mercados premium, tanto no Brasil quanto no exterior.
O açaí do Bailique, que já conta com certificações como o FSC® (Forest Stewardship Council), e o selo Vegan da Sociedade Vegetariana Brasileira, reforça com a IG seu posicionamento como produto de alta qualidade, ético e ambientalmente responsável. Isso cria novas oportunidades para os extrativistas locais, que passam a acessar nichos de mercado mais exigentes e remuneradores.
A ligação entre IG e sustentabilidade é central no caso do Bailique. A certificação estimula práticas produtivas que respeitam os ciclos naturais da floresta e a integridade dos ecossistemas de várzea. O reconhecimento oficial da IG atua como incentivo à continuidade dessas práticas, promovendo a conservação da biodiversidade e o uso racional dos recursos naturais.
Além disso, a IG fortalece a lógica da bioeconomia amazônica, onde a floresta em pé se torna economicamente mais vantajosa do que a conversão do uso do solo. Isso gera efeitos diretos na mitigação das mudanças climáticas e na proteção de territórios vulneráveis a pressões externas.
A Indicação Geográfica protege o nome “Açaí do Bailique” contra usos indevidos por produtores que não integram o sistema produtivo local nem respeitam os padrões estabelecidos. Isso é fundamental para garantir que a reputação do produto não seja comprometida por práticas comerciais oportunistas ou fraudulentas.
Esse tipo de proteção jurídica também fortalece a imagem do território no mercado, preservando os investimentos feitos pelas comunidades locais em qualidade, rastreabilidade e boas práticas de manejo.
O processo de construção da IG exige articulação coletiva, envolvimento de associações, cooperativas, universidades, órgãos públicos e instituições de fomento. No Bailique, esse processo favoreceu o fortalecimento do tecido social e institucional das comunidades extrativistas, gerando maior capacidade de governança local e protagonismo político na gestão dos recursos naturais.
O reconhecimento da Indicação Geográfica do açaí do Bailique é muito mais do que um selo de origem, é uma ferramenta poderosa de valorização de práticas sustentáveis, proteção de identidades culturais e promoção da justiça econômica para comunidades ribeirinhas. Em um cenário global de crescente valorização de produtos com identidade territorial e compromisso socioambiental, a IG representa uma nova etapa no posicionamento da Amazônia como fornecedora de soluções baseadas na floresta, e não em sua destruição.