Zonas de praticagem (ZPs) são áreas estabelecidas pela Marinha do Brasil que exigem o serviço de praticagem na entrada e saída dos navios dos portos. Entre elas está a ZP-1, a maior do mundo, que se estende por 1.300 milhas náuticas, na Bacia Amazônica, em três estados: Amapá, Pará e Amazonas. São cerca de 2.500 quilômetros de extensão.
Os 160 práticos lotados na ZP estão distribuídos em empresas de praticagem responsáveis pelo atendimento dos navios que demandam os portos ou terminais de Santana (AP), Munguba (PA), Santarém (PA), Trombetas (PA), Juruti (PA) e Itacoatiara (AM), no sentido de subida do rio (contra a corrente).
As principais cargas transportadas são bauxita, soja, trigo, petróleo e derivados, contêineres e cimento. Por ano, cerca de dois mil serviços de praticagem são prestados na região, ecologicamente a mais sensível do mundo, onde, além da biodiversidade, as águas alimentam, matam a sede e garantem o sustento de ribeirinhos, pescadores e indígenas. “Na Amazônia, os rios comandam a vida das pessoas”, lembra Ricardo Falcão, prático na Amazônia há mais de 20 anos e presidente da Praticagem do Brasil.
A lotação é a maior entre as 21 ZPs brasileiras, porque o serviço requer, na maioria das vezes, a presença de dois práticos se revezando no passadiço do navio em navegações que podem se estender por até 72 horas, dependendo do trecho e da potência da embarcação. Além disso, devido à extensão da região e à dificuldade logística, a previsão mínima para uma praticagem conseguir levar um prático a bordo é de 24 horas (antes da pandemia do coronavírus).
Extensão
Por exemplo, para uma dupla de práticos em Macapá embarcar em Itacoatiara em um navio que vai descer o Rio Amazonas, é preciso pegar um voo para Belém, outro para Manaus e, depois, seguir de carro por quatro horas até a base da praticagem – um deslocamento que chega a 12 horas, considerando a pouca oferta da malha aérea. “Não existe zona de praticagem com essa dificuldade logística”, observa Adonis dos Santos Passos Júnior, do Grupo Bacia Amazônica Práticos (BAP).
Além de uma base em Itacoatiara, as empresas de praticagem dispõem de outra em Fazendinha (Macapá). Por causa do tempo para se chegar a bordo e das navegações, a escala de trabalho na ZP é de 15 dias.
Outro desafio diz respeito às constantes mudanças no leito dos rios, acompanhadas por batimetria própria da praticagem. Bancos de areia se movimentam permanentemente. A carta náutica da região era da década de 1980 e foi, finalmente, renovada na primeira quinzena de março. A situação provocava questionamentos de comandantes de embarcações, que perguntavam por que seu navio passaria por cima de um pedaço de terra, que, na verdade, já havia sumido pela ação do rio. “O comandante precisa confiar no prático, que faz aquela navegação regularmente”, diz Adonis dos Santos.
Apoio
O prático Castro Alves, da empresa Amazônia Serviços de Praticagem, aponta mais dois desafios ao longo das 1.300 milhas. Um deles é a falta de meios adequados, como no Rio Jari, onde não há o auxílio de rebocadores para atracação e desatracação nos terminais. “Usamos a corrente do rio para encostar e desatracar”, diz.
O tráfego de embarcações apagadas, mal iluminadas ou desprovidas de instrumentos necessários é outra complicação, segundo Castro Alves. “Algumas têm dificuldade até de responder ao rádio. AIS (sistema eletrônico de identificação) poucas possuem. Volta e meia, um empurrador atravessa a nossa frente, e temos que agir com antecipação para evitar um acidente”, reforça.
Calado
O trecho mais crítico de navegação é o arco lamoso da barra norte do Rio Amazonas, que, apesar disso, não exige a assessoria de um prático. Entretanto, por segurança, armadores contratam o serviço para navios-tanque carregados e embarcações que transportam soja e milho com mais de 11,5 metros de calado. Após o trecho, a praticagem é facultativa do Canal Grande do Curuá até Macapá, de onde passa a ser obrigatória até Itacoatiara.
Em março, houve a primeira passagem de uma embarcação pelo novo canal do arco lamoso, até 80 centímetros mais profundo. No mesmo mês, a Marinha autorizou os testes para o aumento do calado na região para 11,90 metros, uma conquista que conta com o suporte de dados da batimetria e tábua de marés da praticagem. O calado médio dos navios aumentou 40 centímetros ao longo do último ano, um ganho de US$ 1 milhão a mais em carga por embarcação.